domingo, 7 de outubro de 2012

O dia em que a baqueta da Porto Rico caiu


A tarde de inverno em São Paulo contradizia a estação e o sol das 13 horas castigava. Já inquieto com a demora, Silvio Viana pula o muro da escola na ânsia de ser atendido pelo caseiro."Fala para ele abrir para nós que os meninos já estão aqui."

Quase vinte minutos depois, o coordenador da Companhia Porto de Luanda consegue entrar na atual sede com o restante dos brincantes de maracatu. Carregando agbês em cima de alfaias, duas em cada braço, eles desviam das obras e buracos de reforma para ensaiar na quadra da Escola Estadual Milton Cruzeiro.

Quando diz os "meninos", Silvio se refere aos dois convidados pernambucanos: Ivan e Deivson, batuqueiros da Nação Porto Rico. Em sua breve passagem por São Paulo, Deivson se apresentou na noite anterior com a Companhia Caracaxá pela programação especial do SESC Pinheiros.

Batuqueiros mostram aos pernambucanos o sotaque da cia
Com cerca de 15 pessoas, entre crianças e adultos, começa a oficina. A primeira requisição de Ivan: "Toquem o que vocês costumam tocar, assim nós podemos trabalhar seu sotaque." E assim tocam os batuqueiros da Porto de Luanda, sob orientação dos convidados. Quatro horas e meia de ensaio depois, todos guardam os instrumentos já apressados. A escola deveria ser fechada às 17 horas do sábado e o relógio indica 20 minutos pós-prazo.

Já do lado de fora, batuqueiros e coordenadores se reúnem em um dos bares próximos à Praça dos Professores, em Itaquera, zona leste da capital paulista. "Agora o ensaio é no fifty cent", brincam, "tudo aqui custa cinquenta centavos".Silvio pede três cervejas e uma Seleta para começar a entrevista. Do lado de fora, batuqueiros pernambucanos e paulistas conversam descontraidamente sobre o assunto que os une: o maracatu. 

Ao som ambiente, um forró universitário, o arte-educador e fundador da Porto de Luanda discorre sobre sua paixão pela música, a devoção a Nossa senhora do Rosário dos Homens Pretos e  São Benedito. Entre os goles e as interrupções, o também filho de Ogum ressalta como o maracatu mudou sua vida. E a realização de um sonho: tocar na Noite dos Tambores Silenciosos no carnaval de Recife.

Viana chama Deivson para tomar um gole de cerveja e conta como ajudou com o apoio da Nação Porto Rico em 2011: "Eu não participo tocando, porque o pessoal ensaia o ano inteiro por esse momento. Acho injusto querer desfilar junto. Mas no que eu puder para que eles façam um bom desfile, eu ajudo."
Apontando para o ogã da Porto Rico, ressalta: "Esse aqui deixou a baqueta cair no carnaval passado e eu estava atrás para recolher".

Deivson contextualiza sem desmontar o sorriso: "O batuqueiro não pode abaixar para pegar a baqueta quando ela cai, senão a Nação perde pontos. Eu sempre levo um par a mais preso à alfaia por precaução, mas o Silvão recolheu a minha e a Porto Rico foi campeã". Assim se mistura a história da Cia Porto de Luanda e da Nação Porto Rico, que entre santos e orixás, compartilham uma mesma cultura: o maracatu, seja nos mangues, seja na terra da garoa.

terça-feira, 25 de setembro de 2012

A batida do coração

- Como você veio parar no maracatu?
- Sentei na arquibancada do Alves (Colégio Alves Cruz, Sumaré, São Paulo) e comecei a assistir o ensaio. Comentei com a minha amiga, "uau, isso faz igual o tum tum do coração".

A batida que pulsou no mesmo ritmo do peito foi o que fez a estilista Mariana Vicenzo se interessar pela cultura do maracatu de baque virado. Após algumas visitas aos ensaios do Projeto Calo na Mão, ela se inscreveu na oficina de alfaia e em agosto concluiu o curso.

- Eu sinto o maracatu. Entrei nele para sentir coisas diferentes do que eu vivia. Aqui as pessoas têm carinho umas com as outras. A energia me faz vir aqui todo sábado a tarde e passar três horas tocando. Meu ombro fica destruído, com calos na mão, mas eu adoro e mais, sinto orgulho de dizer que conheço o maracatu.

Ouça um trecho da entrevista com essa nova batuqueira. A entrevista toda, em breve, no nosso livro.  




Foto: Paulo Vargas